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2023-07-14

Rui Pedro, 93 anos. O artesão de Arronches que faz magia com a navalha

As décimas que resumem quase um século de vida de Rui José Pedro retratam as obras que saíram das mãos deste artista pelos anos fora: «...Começou por fazer cadeiras/Tarros, saleiros e copeiras/Fez excelentes bordados/Fez cestos e fez quadros/Tudo com grande perfeição/Com a Magia da navalha e a certeza na mão...». E outras revelações se testemunham à «boleia» da arte poética que está exposta no stand que o mais antigo artesão de Arronches ocupa por estes dias na Feira das Actividades Económicas

TEXTO l Roberto Dores
 
   Recuemos até à década de 30 do século passado, quando ainda criança se fez à vida para ajudar os pais a levarem comida à mesa. Aos 7 anos «vestiu» a pele de boieiro. «Comecei logo a andar atrás da boiada no Monte d'el Rei. Não aprendi uma letra, porque a minha escola foi a vida dura do campo. Ia a casa de 15 em 15 dias ou de mês a mês. Era como podia ser naquele tempo», relata.


   Haveria de começar a lavrar com recurso a bois, mas com o passar dos anos aprendeu tudo o que era trabalho rural. «Tínhamos que saber, fazia falta, apesar de se ganhar uma miséria. Era assim, pronto», diz resignado, enquanto relembra a habilidade que lhe despontou das mãos para começar a fazer cáguedas depois de observar atentamente as técnicas dos mais velhos.


O que são cáguedas? Servem como fechos de coleira de gado com chocalhos suspensos. São maioritariamente feitas de madeira, embora também possam ser de corno e de cortiça.

   Rui José Pedro recorria a qualquer tipo de madeira que ia pacientemente cortando ou raspando com a companheira e sempre bem afiada navalha. Passou a fazer várias cáguedas durante o dia de trabalho no campo. De sol a sol e, muitas vezes, já de noite cerrada. «Depois decorava-as com uns desenhos que me vinham à cabeça para ficarem mais bonitas. E ficavam», conta, sendo a mesma lógica que acompanhou o «nascimento» dos badalos, das peças em cortiça ou em chifre. 


   Mostra-nos um exemplar que pode assumir a função de cabide. «Esta foi feita com cornos de carneiro, mas também há aqui de vaca e de muitos outros. Vê ali aquele corno? Leva azeitonas ou azeite. É uma tradição daqui», assume o artista, enquanto «puxa» pelos quadros que exibem figuras geométricas e cores pintadas na madeira. 

   «Já comecei a fazer os quadros depois de reformado. Também são coisas que eu penso e faço com uma madeira qualquer, apesar de haver umas madeiras melhores do que outras», conta o «decano» dos artesãos de Arronches, que volta a mostrar os trabalhos de uma vida na Feira das Actividades Económicas ao lado de outros artistas da terra. Estará por aqui até domingo.
 

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