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2023-01-28

«Bonecos de Estremoz impressionam pela linguagem. Mostram que o passado não passa»


O figurado em barro que sai das mãos dos artesãos de Estremoz deixou «impressionado» José Newton Meneses. O professor do Departamento de História da Universidade Federal de Minas Gerais vê nesta manifestação cultural «um valor identitário» que mostra ao Mundo «o que Estremoz foi e continua a ser»

TEXTO | Roberto Dores

   José Newton Meneses acabava de dar uma conferência sobre «Património e História Pública», em pleno Museu Berardo, enfatizando, em declarações ao Sul Ibérico, que a arte que rodeia a construção dos Bonecos de Estremoz traduz os «fazeres» de outros tempos, sublinhados pelo «orgulho do saber fazer simples, com a transformação necessária à adaptação dos nossos dias.»

José Newton Meneses: «Fazeres rurais, urbanos, emocionais. Está tudo manifestado naqueles bonecos de forma rica e criativa»

   O professor encara mesmo o figurado estremocense como uma espécie de indicador rumo ao futuro onde as heranças ancestrais terão sempre lugar privilegiado. Escutemos José Newton Meneses: «Os Bonecos de Estremoz impressionam pela linguagem. Expressam tradição e mostram que o passado não passa». 

   Com mais de uma centena de figuras diferentes inventariadas (entre elas os famosos Presépios de Altar, o «Amor é Cego», a «Primavera», os «Fidalgos e Fidalguinhos» ou «Rainha Santa Isabel»), a arte, a que se dedicam vários artesãos do concelho, consiste na modelação de uma figura em barro cozido, policromado e efectuada manualmente, segundo uma técnica com origem, pelo menos, no século XVII.  


Heranças: «A tradição traz a origem para o presente e leva-a para o futuro, fazendo com que algo seja tradicionalmente permanente»

   Na visita que realizou aos célebres bonecos, que são património do Mundo, José Newton Meneses percebeu em segundos o que os artesãos de outrora exibiam com a sua arte. «Fazeres rurais, urbanos, emocionais. Está tudo manifestado naqueles bonecos de forma rica e criativa, como algo que existe e que foi construído pela própria população de Estremoz», disse, sublinhando que também encontrou os traços da evolução.

   «Com o tempo, a tradição foi-se enriquecendo. A tradição traz a origem para o presente e leva-a para o futuro, fazendo com que algo seja tradicionalmente permanente", acrescentou. 

   Hugo Guerreiro, do Departamento de Cultura da Câmara de Estremoz, concordou. «Os Bonecos de Estremoz são uma manifestação cultural que herdámos do passado, mas recreámos no presente». Ou seja, justificou, «os bonecos de hoje não são os bonecos de ontem. As novas gerações, a quem é transmitida a arte, recriaram e adaptaram-nos à nova mundividência e à sociedade actual. Surgiram temas e bonecos novos». 

Hugo Guerreiro: «Os bonecos de hoje não são os bonecos de ontem. As novas gerações recriaram e adaptaram-nos à nova mundividência

   Destacou o mesmo responsável que o mais importante é garantir a salvaguarda e a forma de produção. «A modelação e a estética do boneco mantêm a essência do que é o boneco de Estremoz», disse, alertando que não se pode esperar que a barrística estremocense permaneça «fossilizada e cristalizada, fazendo apenas cópias do que era feito no passado».

   Aliás, Hugo Guerreiro referiu que «a história serve para dar uma perspectiva do que fomos e indica-nos caminhos. Quer dos espaços do património imóvel, quer do património imaterial. Nós temos aqui caminhos e, como alguém já escreveu, é no passado que está o futuro», disse, alertando ainda para a importância de se olhar para a forma como os antepassados geriam o território. «Temos que voltar a gerir um pouco assim, obviamente, adaptando às necessidades de hoje, porque o passado é um recurso», sustentou.

Conferência que afirma Estremoz como cidade de cultura
Sobre a conferência de José Newton Meneses, Hugo Guerreiro destacou a oportunidade de se assistir a uma aula que ajudou a afirmar Estremoz como «espaço de construção e divulgação de conhecimento», através da Fundação de Ciência e Tecnologia e do Centro Interdisciplinar de História, Culturas e Sociedades (CIDEHUS) da Universidade de Évora com apoio do Município de Estremoz.
 
 

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