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2022-03-14

Mostra de peixe do rio do Alandroal contada de A a Z

 
A 13ª Mostra Gastronómica de Peixe do Rio terminou ontem. Face às condicionantes da pandemia, o evento realizou-se no modelo tradicional, nos restaurantes e cafés aderentes de todo o concelho. Mas houve muito e bons motivos de reportagem. Eis o resumo

 
A
 
ALANDROAL. A 13ª Mostra de Peixe do Rio funcionou como um «safanão» contra aquela espécie de letargia que nos tem sido imposta em tempos de pandemia. Durante uma semana Alandroal pôs a restauração do concelho a "mexer", com casas cheias ao almoço e ao jantar. Dito pelos próprios gerentes dos estabelecimentos. Uma realidade que, só por si, já se traduziu num novo impulso para a economia local, tirando partido de um recurso em que o concelho é rico: Peixe do mesmo rio Guadiana que passa ali perto. Mas o Município alentejano foi mais longe: traçou estratégias rumo ao futuro, colocando a identidade, tradição e sustentabilidade na linha da frente, conjugadas com a inovação. Deu pistas para novos negócios, abriu portas à investigação e apontou a novas dinâmicas. Em paralelo a estes dias em que o peixe do rio reinou, ainda foi a tempo de apresentar eventos singulares - pelo menos à escala do Interior do País - para os próximos meses.
 
B
 
BARBO. Foi uma das «estrelas» da mostra. O pescador João Ramos, o único no concelho que trabalha nesta actividade a tempo inteiro, tinha garantido que a época do ano era a ideal para o barbo ir à mesa. Confirmou-se. Quer na escalda de peixe, quer na versão peixe frito esta espécie marcou pontos. E não, não tem sabor a lodo, porque como também explicou João Ramos, é capturado nas zonas rochosas de Juromenha.
 
C


CERVEJA E CÉU. A cerveja artesanal tem ponto de encontro marcado com o Interior do país pela primeira vez e é logo para ver estrelas. O Alandroal vai receber o festival A Beer In The Sky, que ambiciona ser um acontecimento surpreendente entre os dias 10 e 12 Junho, habilitado a juntar no Castelo 35 cervejeiras. 20 portuguesas e 15 estrangeiras. A organização espera que as visitas possam chegar às 10 mil pessoas, contando com a parceria da Dark Sky Alqueva, a “Reserva de Escuro”.
Octávio Costa, da organização do evento, justifica que além da cerveja artesanal haverá bandas, Dj´s e performances artísticas. Apolónia Rodrigues, coordenadora do Dark Sky Alqueva, destacou o facto deste festival que junta cerveja e observação de estrelas, se dirigir a um público específico que valoriza muito este tipo de ofertas.
 
 
 
D

DICA. Foi no restaurante A Maria que ficámos a saber qual é a melhor «táctica» para comer peixe frito: «É à mão. Digo sempre ao meus clientes quando levo a comida à mesa» , explicou Maria da Piedade Monteiro, justificando que «além de saber melhor, permite evitar as espinhas mais facilmente, do que se comermos de faca e garfo».  
 
E

 
ESCOLAS. Levar o peixe do rio às ementas das escolas do Alandroal é um projecto que está em carteira, sendo encarado como uma espécie de «rampa de lançamento» habilitada a atrair os paladares mais jovens para barbos, carpas e sáveis pescados no Guadiana. A ideia ganhou adeptos entre os chefes participantes no Congresso das Cozinhas do Rio. Por parte da autarquia ficou a certeza de que o projecto tem «barbatanas para nadar». 
 
F

FERREIRA DE CAPELINS. Se a ruralidade marcou presença transversal à Mostra, a caminhada pelo percurso pedestre «Os Segredos de Ferreira» assinalou o contacto direto com a natureza, com cerca de 80 participantes. Ferreira de Capelins foi o «palco», com partida do Lagar para um percurso de dez quilómetros de fácil dificuldade, que se cruza com várias espécies selvagens. Um lugar a descobrir. Já em Juromenha houve lugar a concurso de pesca desportiva, no Monte Branco, que contou com a co-organização da Associação de Pesca Pesquisindex «Os Marujos».
 
G

 
GUADIANA. Se o chefe José Júlio Vintém tratou de mostrar como é possível trabalhar o peixe do rio na cozinha, tirando o máximo partido da sua frescura e tornando-o numa iguaria ímpar no Alentejo, o empresário João Cortez marcou presença no certame para assegurar que o sável do Guadiana é «o melhor do país», depois de se ter adaptado à água doce. "Tem aqui boas condições. Em cada dez exemplares, nove têm ovas, enquanto nas outras regiões é ao contrário», revelou, destacando que o peixe é analisado semanalmente «e não há igual à sua textura». Também por isso o empresário acha «estranho» que o Alandroal seja o único concelho do Sul onde são servidos pratos de sável e que a maioria dos exemplares vá para o Norte.
 
H

HÁBITO. Pode levar o seu tempo. Mais para uns do que para outros. Mas há um detalhe inequívoco que ficou patente nesta mostra. São cada vez mais os clientes que chegam aos restaurantes do Alandroal para comerem peixe do rio. Escutemos o registo de Juromenha com testemunho de Janete Pepe, do restaurante Pata Larga: "Muita gente está mais habituada ao peixe do mar e nota muita diferença. Mas depois de provar melhor e apurar o paladar começa a gostar. Há aqui um hábito que temos vindo a ganhar", diz.
 
J

JOÃO MARIA GRILO. O presidente da Câmara do Alandroal não tem dúvidas sobre as dinâmicas que o peixe do rio é capaz de habilitar no concelho. E quer mais. Sempre sem perder de vista a sustentabilidade dos recursos. Anunciou que a mostra do peixe não pode ser restrita a apenas uma semana, pelo que ambiciona dinamizar mais eventos associados à gastronomia, juntando outros produtos regionais. «Aquilo que é nosso e que é autêntico, se não for todos os dias promovido, alimentado e acarinhado, corre o risco de desaparecer», alertou João Maria Grilo, fazendo notar que «a maior parte das pessoas que seguram as nossas tradições, seja nos enchidos, queijos, mel ou nas ervas aromáticas, são de idade avançada e estão em fase de abandonar a actividade». O futuro é já ali.
 
L

LAGOSTINS. Estão entre os novos negócios potenciados pela barragem de Alqueva. O pescador Pedro Santos foi à Mostra de Peixe do Rio relatar que há 18 anos nem conhecia os atributos do lagostim, mas hoje já reúne oito trabalhadores a pescar esta espécie, que é toda vendida para Espanha. «Quando comecei a ver que estavam a chegar pescadores espanhóis para apanharem lagostins no Guadiana, eu ainda nem sabia de que espécie se tratava. Para mim, aquilo era só uma praga», começou por contar. O tempo e a experiência ensinaram a este pescador alentejano que o lagostim-vermelho-do-louisiana traduzia, afinal, um «potencial de grande negócio».
 
M

MAR. O que trouxe o mar ao encontro de peixe do rio? Uma curiosidade que em Portugal ainda não tem adeptos, mas que em Espanha é iguaria muito apreciada. Falamos das anémonas que a chefe Joana Duarte exibiu como sendo utilizadas na culinária profissional. São semelhantes às ostras e podem ser fritas, acompanhadas com maionese e limão.
 
N

NAVEGAR. O grande rio do Sul vai de leito generoso, apesar da seca, confirmando a relevância da reserva estratégica de Alqueva. Dos «novos negócios» que a água potencia falamos mais abaixo, porque aqui destacamos a questão da navegabilidade entre Badajoz e Juromenha, que tem sido reclamada pelo Alandroal, mas que recentemente encontrou aliados do lado espanhol. Encarada como um «passo gigante» para o turismo em ambos os lados da fronteira, a ideia merece a aprovação do representante da Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas de Alqueva (EDIA), João Martins, que participou no encontro sobre as novas oportunidades dos nossos rios.
 

O
 
O RIO À VISTA. Eis o título da exposição fotográfica de Humberto Mouco, que retratou a vida dos pescadores no rio Guadiana, patente no Fórum Cultural do Alandroal. Antes da sua inauguração foi exibido o filme promocional do concelho, que mostra gentes, tradições, usos, histórias e costumes.
 
P

POEJO. É uma das ervas aromáticas praticamente transversal a todos os pratos de peixe do rio. Só não está sempre presente, porque, como o paladar é intenso, há quem não goste. «Ou se ama ou se odeia», afirma a proprietária do restaurante Pata Larga, Janete Pepe, testemunhando que já assistiu à conversão de alguns clientes. «Ao princípio detestaram a escalda de peixe, porque tinha poejo, mas voltaram a provar, tempos depois, e mudaram de opinião», relata.
 
Q

QUADRO COMUNITÁRIO DE APOIO. O presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo (CCDR), António Ceia da Silva, aproveitou a presença de vários autarcas da região na inauguração da Mostra para destacar ser esse o espírito que quer ver no próximo Quadro Comunitário de Apoio, alertando que «ninguém faz nada sozinho». Ceia da Silva deu prioridade ao combate à desertificação, assumindo que a recuperação de habitantes será o principal desígnio no próximo quadro. «Os projectos serão valorizados se traduzirem a fixação de jovens e atracção de jovens para os territórios», sublinhou, colocando ênfase na necessidade do Alentejo recuperar ainda os jovens que perdeu ao longo dos últimos anos. O projecto passa por assinar protocolos com as câmaras para que os jovens que saíram da região possam regressar mantendo o vínculo laboral com o estado e com as empresas. 
 
R

RICAS CONSERVAS. As conservas de peixe do rio estiveram entre as maiores novidades da mostra. A Bem Amanhado - assim se chama a empresa - confeccionadas com métodos e receitas tradicionais da cozinha portuguesa. Trabalha principalmente com espécies invasoras, procurando contribuir para o equilíbrio da biodiversidade dos ecossistemas. Da carpa  grelhada ao escabeche de lúcio perca, do achigã assado à caldeta de barbo ou do sável Frito à fataça estufada. Também há patê de Peixe do Rio.
 
S

SOMOS OS QUE COMEMOS. Chama-se festival «Soil to Soul» e vai decorrer entre os dias 14 e 15 de Maio no Castelo do Alandroal. Objectivo: promover a alimentação saudável. Prioridade: garantir a participação das crianças O presidente da Câmara do Alandroal, João Maria Grilo, apresentou este festival como um espaço que ambiciona convocar as pessoas para conviverem «através da música, da animação e da gastronomia, com a colaboração de pessoas ligadas à gastronomia que nos ajudarão a consumir de forma mais equilibrada».
O casal Anna e David de Brito, da quinta biológica Terramay,  estão na organização do festival «de sensibilização alimentar e agricultura regenerativa», disse Anna, puxando do conceito, segundo o qual, «somos o que comemos», aludindo a prioridade que deve ser dada à preservação da natureza. Anunciou comida «saudável e deliciosa» com participação de quatro chefes, oito produtores de alimentos regenerativos, artesãos locais, músicos «e muitos convidados para embarcar numa viagem gastronómica».
 
T

TURISMO. O potencial da gastronomia foi apresentado como um factor de atractividade pelo presidente da Entidade Regional de Turismo do Alentejo. Vítor Silva destacou que  “hoje em dia, a gastronomia é algo que move pessoas e que acaba por ser uma alavanca para a actividade económica. Estes eventos, relacionados com a gastronomia, são muito importantes. Aqui há vinte anos, ninguém pensava que as pessoas se podiam deslocar», sublinhou, destacando as características da cozinha tradicional alentejana com base no pão e ervas aromáticas colhidas no campo.
 
U

UMA CERTEZA. A Mostra de peixe do rio terminou com a mesma certeza com que tinha começado. O peixe do rio está a sair de uma lógica que o enquadrava como um produto pouco valorizado, associado apenas ao consumo local e hoje já entra nas ementas dos chefes dos restaurantes, está a chegar a outros mercados e a ser transformado de outras formas.


V

VINTÉM. José Júlio Vintém. O chefe proprietário do TombaLobos (Portalegre) voltou a colaborar na organização da Mostra de Peixe do Rio exibindo várias soluções para levar as iguarias à mesa. Além dos três cursos de culinária que marcaram a mostra, Vintém lançou um olhar rumo ao futuro, assumindo que há espaço para o peixe do rio crescer entre as restauração da região, tornando Alandroal a capital da cozinha de rio. O chefe confia que em breve haverá ainda mais adeptos de peixe de água doce.


X

XIII. Ou seja, a 13ª edição da Mostra de Peixe do Rio do Alandroal pode muito bem ter sido a rampa de lançamento para o festival de peixe que se pretende alcançar já em 2023, caso a pandemia dê tréguas e possibilite alargar a malha. Organização e restaurantes convergem na ideia de que há espaço para crescer e que a promoção em torno do peixe do rio projecta o Alandroal e a própria a região. 


Z
 
ZÉ DO ALTO foi um dos restaurantes que participou na Mostra, ao lado da Chaminé, A Maria. Adega dos Ramalhos, Café Restaurante Central, O Mercado, Centro Cultural e Desportivo Marmelos, O Tarro, Pata Larga, Pirâmides São Pedro, O Botas, Sentinela do Guadiana e Taberna Ramalho.
 

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