Notícias

2024-04-12

Vamos à bucha? Essa tradição tão alentejana que se perde no tempo

Ali, a tempo certo, o corpo é que diz as horas, mas ninguém olha ao relógio. Ficam os afazeres em suspenso e corre-se para os locais de encontro. Espalham-se em sítio plano produtos da região, de preferência, caseiros e da época. Segue-se a degustação, conforme o apetite mais ou menos ávido do operário


TEXTO | Manuel Inácio Pereira
FOTOS | D.R.

   A expressão «tirar uma bucha» é um costume ancestral alentejano, que, entre a população residente, não passa por mais do que fazer a pausa no trabalho, para satisfazer a ausência de alimentação, passadas algumas horas de lavor.

   Muito usual, entre populares da região, durante as lides do campo e outras tarefas mais «pesadas», a «bucha» serve um único propósito: o de retemperar fôlego e forças, para as diferentes «labutas» diárias, até ao término do horário normal de trabalho.

É hora da «bucha». O trabalho pode esperar 

   Simultaneamente, descansam braços e pernas, enquanto, por breve que seja o espaço temporal desta prática, o corpo e, em especial o estômago, ganham algum «aconchego» para aguentar até final da jornada laboral. 

   Agora, difícil mesmo é dizer não à tentação de «petiscar» pão alentejano, com azeitonas de conserva, «(ar)retalhadas» e temperadas, queijos frescos ou curados, linguiças e paios, ou toucinhos e torresmos. Tudo bem empurrado, com um «copito» de vinho (a conta peso e medida). E não é que marcha tudo?

   Já em Borba a tradição é passada de geração em geração, com os mais novos a seguirem «pisadas» dos antecessores, mas a que deram outra nomenclatura; diz-se «Fazer as Onze», porque pelas 11.00 horas todos os homens que trabalham no campo e nos ofícios rurais param para tirar a tal «bucha».
 
O melhor da região junta-se ao «petisco». Dos enchidos aos queijos, das azeitonas ao pão tão típico do Alentejo

   A diferença é apenas no nome, porque na génese e na prática a forma é idêntica. À volta do vinho e, de acepipes da «terra», nas tabernas do concelho, cheias de gente, reúne-se o povo a comentar os problemas do dia de trabalho e outros, algumas vezes acompanhados já de saída pelo cante alentejano, no fim do repasto.

   Aqui, este ritual é bem visto como elemento até turístico e faz apanágio entre os presentes, associado à prática do Cante, em contexto de ambiente rural.
Finda a pausa, deste acto, fechadas as navalhas, que têm o tal gume de ferramenta de barbeiro – que o bom alentejano de «gema» não dispensa, ressalve-se – é tempo de voltar às lides e reiniciar a azáfama das tarefas, que o dia ainda agora começou.
 
   Lá para o pôr-do-sol haverá mais da mesma coisa. Mas isso é outro «petisco». Que é puro e cá da terra.
 
 

Artigos Relacionados

« Voltar